domingo, 14 de julho de 2013

Dos linotipos aos teclados, o jornalismo em evolução

Colunista de Mercado da Folha, Mauro Zafalon explica como foi o processo de adaptação das redações após o surgimento da internet


Mauro se beneficiou com o surgimento dos computadores, que facilitaram o processo de correção de seus textos, sempre escritos rapidamente, como diz
Desde a década de 70, Mauro Zafalon presencia diariamente a rotina de uma redação jornalística. O atual colunista de Mercado da Folha de São Paulo passou por momentos históricos do país e do jornalismo durante a carreira, a qual destinou 35 anos ao jornal durante duas passagens. Entre estes acontecimentos está o surgimento de uma nova ferramenta: a internet, que teve chegada “inevitável” no cotidiano da profissão, como classifica.

“Hoje a produção é muito mais ágil”, comenta Zafalon, comparando os atuais computadores com linotipos e fotolitos de tempos não muito distantes. Para o colunista, mudanças são benéficas para a produção e vida do jornalismo, e entende a nova tecnologia como aproximadora da informação para os jornalistas. “Com um clique, tenho acesso de casa a tudo que escrevi no jornal desde 72”, explica. 

Entretanto, diz que o produto jornalístico se tornou descartável com tamanha velocidade, pelo fato de não existir apuração em muitos momentos. “Antes os jornalistas tinham o dia todo para fazer uma matéria”, lembra, acrescentando que esse era o tempo de pesquisa para cada pauta e que perdemos nessa transição. Mauro entende que antes existia maior confronto entre as informações e estas eram “consistentes” e não tão “fast-food” como hoje.

Apesar da enorme diferença, explica que se adaptou às mudanças sem maiores problemas, num processo que aconteceu com o tempo. Mas ressalta que não foi assim com todos os jornalistas, pelo contrário. “Profissionais mais velhos tiveram dificuldades. Os veteranos diziam para continuar o fazer jornalístico de antes”. 

Como se sabe, a vontade deles não virou realidade. A evolução do jornalismo veio e ainda está sendo realizada, num processo lento, que acontece com o tempo, assim como foi a adaptação de Mauro Zafalon com a nova fase da profissão. Confira a entrevista com o experiente colunista:

Arthur Stabile: Como era a atuação na década de 70?
Mauro Zafalon: Naquela época, as redações ainda tinham linotipos de chumbo e um pouco depois vieram os fotolitos. Eram processos muito demorados. Computadores e internet mudaram isso. Primeiro com o surgimento dos bancos de dados, em 1980. Um problema em 70 era saber onde buscar a informação, pois quem não tinha banco de dados ficava sem elas. Hoje, você entra no Google e tem tudo o que precisa. É outro momento. 

AS: E a apuração?
MZ: O time era outro. Tínhamos pouca agilidade. Os jornais não podiam perder o trem. Então o fechamento, muitas vezes, era uma ou duas da manhã. Hoje em dia, às 9 da noite, já estou em casa, sendo que o jornal fechou as sete ou oito. Uma diferença é que, agora, temos disputas nas próprias coletivas. Você tem do lado um monte de micros que enviarão a notícia na hora para agências como a Reuters propagarem a informação.

Jornalista acumula mais de três décadas de atuação somente na 
Folha de São Paulo, onde hoje é comentarista de Mercado
AS: Vê de que maneira a mudança?
MZ: Mudanças sempre são benéficas. Com um clique, tenho acesso de casa a tudo que escrevi no jornal desde 72 e todo o arquivo desde a fundação. Ganhamos agilidade na produção, o que precisamos ter cuidado. As notícias se tornaram um produto descartável e, em muitos momentos, pode não existir apuração. Perdemos neste sentido. Antes os jornalistas tinham o dia todo para fazer uma matéria. Esse era o tempo para realizar a pesquisa, confrontar o que fosse descoberto. Perdemos este tempo na transição para a internet. É preciso confrontar as informações para que sejam consistentes e não tão fast-food como hoje. 

AS: Você se adaptou rápido com os computadores?
MZ: Foi um aprendizado com o tempo, aconteceu aos poucos.  Minha adaptação veio sem eu notar. Antes o processo era demorado com as máquinas de escrever e chapas das rotativas. Escrevíamos a matéria, enviávamos para revisão, depois voltava e fazíamos ajustes para mandar de volta para um novo concerto. Só aí que poderia ir para as chapas das rotativas. Era um processo realmente demorado. Agora é simples, ganhamos muito. Faço o texto, subo e já está pronto para alguém revisar. Não senti dificuldades, ainda mais porque sempre escrevi muito rápido e perdia tempo corrigindo o texto. Hoje só preciso apertar um botão, não mais parar de escrever para corrigir cada pequeno erro.

AS: Foi assim com outros jornalistas?
MZ: Na época tinha 40 anos, foi tranquilo. Não senti dificuldades. O primeiro contato foi com um computador que só armazenava dados, a Prologica 500. Era boa ferramenta.  Mas nem todos os jornalistas tiveram essa facilidade como eu. Profissionais mais velhos, de 50 ou 60 anos, enfrentaram maiores dificuldades. Eles falaram “Para com isso, vamos continuar como está” e não avançaram. E faziam isso por não saber por mais quanto tempo estariam na ativa e nas redações. 

AS: Acredita em outra mudança como esta no jornalismo?
MZ: Sim, o jornalismo caminha. Não podemos apostar no que vem. Em breve pode ser que conseguiremos qualquer informação na tela de algo e imediatamente converter em notícia ou algo do tipo. Não deve demorar.  Antes havia grande concentração da atenção nos jornais e hoje não vemos mais publicações da cotação da bolsa em suas páginas, o que era inimaginável há 20 anos. 

AS: Como pensa que será o futuro do jornal?
MZ: O jornal impresso terá que se adaptar. Será preciso aproveitar os diversos nichos que criou para seguir evoluindo junto com as mídias. O futuro do jornal deve ser bem setorizado e não mais este enorme leque de conteúdo para a satisfação do público. Além de que o impresso pode não mais existir dessa forma. É até mesmo provável que não exista mais em papel e caminhe para o Ipad, Iphone. O Jornalismo espera e demanda cada vez mais rapidez.

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